Cartas Ausentes

Postado por Fernanda Huppert 0 Viajaram Aqui
Despertou a primavera, mas eis que meu coração é eterno Outono. Outono porque resisti ao frio do Inverno, mas deixei cair as flores entre mim e o sonho.
E nem as flores que ponho no cabelo poderão apagar o Outono de Março. Mas hoje, só hoje, eu quis que a rua fosse Outono de amor e que as folhas desse Outono se transformassem em folhas soltas de amor.
E a cidade cobrir-se-ia de cartas amadas e amantes, guardadas em livros antigos, abandonadas nas ruas, pisadas como folhas velhas de um Verão que passou. Das árvores cairiam cartas de amor ao mundo - a mim, a ti, ao outro, ao alheio, aquele, aquela.
E todo o coração escreveria uma carta de amor, que deixaria sobre um banco de jardim, sobre uma esquina da rua, sobre a mesa do café, sobre o bancos, ruas, avenidas.

E a cidade seria feita de ruas enamoradas, de cartas abandonadas, recolhidas por mãos alheias, suspeitas, distantes, amadas, sentidas, carentes, amantes.
Mas esse é apenas um Outono do meu coração.
Talvez eu escreva, um dia, uma carta de amor sobre o teu nome e a abandone na tua rua, largada ao vento, ao sol, ao mundo.
E talvez eu deposite sobre o meu nome a flor que trarei no cabelo quando a primavera despertar em mim, em sua proxima estação...

Fernanda Huppert

Eu, a menina...

Postado por Fernanda Huppert 1 Viajaram Aqui
Fui, na infancia, uma menina de bata branca que corria no recreio. Escrevia cartas de amor às escondidas da mãe e fazia-me de princesa nos jogos da escola. Os sonhos, trazia-os eu na palma da mão, presos por um fio de prata como se fossem balões que me arrastavam no ar.
Eu era uma menina com asas na mão. Nessa altura, eu olhava para as “maquiagens” de minha mãe e para os sapatos que ela tinha, e chorava.
Não queria ser uma menina pequena com meia dúzia de sonhos tolos na mão. E sempre que eu chorava descobria que saía apenas água salgada e nunca a crença nesses pequenos grandes balões. Eu acreditava ter nascido no tempo errado dos amores.

A história havia começado sem a princesa. Hoje cresci, as mãos cresceram.
Descobri que o coração ficou mais pequeno para os sonhos e maior para o medo.
O coração é elástico. Os sonhos não são mais balões – se o são, fugiram e eu caí ao correr atrás deles.
Se alguém perguntar se fui feliz – não, não perguntem – eu mandaria perguntar se os sonhos doem mais agora do que doeram enquanto pousados na bata branca. Tento esconder-me das fotografias de criança para não ter que admitir que fracassei em todos os balões que eu, ainda menina da bata branca, trazia presos em mim.

Eu não soube guardar meus sonhos quando menina.
Não, não a tragam até mim, esta menina que perdeu-se, o seu sorriso triste perguntaria coisas e olharia para a palma da mão onde não estariam mais os sonhos que eu deixei a vida matar.
Eu sei que ela iria querer saber:

- Se tens uma mão maior do que a minha, como é que os balões não couberam na tua mão?E eu teria para lhe dar apenas o silêncio que ela veria engasgado no meio da minha garganta. Talvez ela percebesse que eu enchi demais os seus balões com silêncios mortos e eles estouraram pelo ar.
Lembro-me que a menina da bata branca era feiticeira e tinha nos olhos uma bola de cristal. Adivinhava coisas doces no futuro e eu não seria capaz de dizer que aquilo que ela via não era amor, mas sim um barco perdido que se afundava com todos os sonhos num baú.
Como dizer a uma menina, que guardava no bolso cartas de amor, que todas as suas previsões estavam erradas?
Como lhe dizer que todas as lágrimas que chorou não foram suficientes, porque dentro de mim e dela existe um oceano?
E eu sei que ela diria, entre o correr silencioso de uma lágrima, que podemos sempre encher novos balões. E eu não seria capaz de lhe dizer que perdi todas as forças para prender balões a mim.
Mas eu diria que ela estava errada quando disse que nasci no tempo errado dos amores.
Não nasci ...
Não, não nascemos menina ...
Porque nunca existiu um tempo certo para gente como eu e você...

Fernanda Huppert

Menina Solidão

Postado por Fernanda Huppert 0 Viajaram Aqui
Era uma vez a menina solidão com coração de papel. A menina era uma princesa fechada na cidade dos deuses, onde o mar engolia os sonhos que tinham medo de voar. Por isso, o príncipe menino escondia na lua os sonhos da princesa solidão, para que o mar não encontrasse os sonhos da menina e engolisse para sempre a sua dança.
Enquanto ela dormia, o menino soprava os cabelos da princesa e pousava-lhe um beijo leve sobre os fios, que lhe adormeciam as lágrimas e a deixavam dormir longe do mar.
Quando acordava, ela dançava pelas ruas e incendiava-as de sonhos, cantando para o príncipe, que a ouvia escondido nas infinidades da lua.

Durante o dia, com os olhos longe da grande bola lunar, o coração da menina chorava lágrimas de papel. Quase parecia que em vez de papel, eram diamantes pesados que lhe doíam no peito. O menino recolhia as lágrimas da menina e guardava-as em safiras e rubis que faziam a lua brilhar. O grande segredo do menino, era que o seu coração era feito de lua, uma lua grande e redonda que nascia no céu para ver a menina dançar. Quando dormia, a menina sentia apenas o beijo do príncipe sobre seus cabelos e era como se o mar agitado dentro dela pudesse finalmente cessar.
E esse é o grande mistério que faz brilhar a lua… as lágrimas tristes da menina solidão recolhidas pelo príncipe menino que faz dos sonhos dela, o seu palácio.

Fernanda Huppert

Entre Desejos e Fugas

Postado por Fernanda Huppert 0 Viajaram Aqui
Ela sangrava amor. E fugia. E os corpos apagados nos quais ela embatia sem pedir desculpa não reparavam porque o amor não é como o sangue – não mancha a roupa.
Os gritos mudos de socorro não lhe saíam da boca cada vez mais suja de amor.
As pernas não eram mais pernas, eram antes pedaços de dor numa marcha desvairada pelos becos. Os olhos ferozes deixavam de o ser quando os corpos desalinhados os escondiam do mundo. O medo era, nesses dias, a força dos ventos e dos mares que ela traçava nas ruas sem que ninguém os sentisse no rosto. Porque ela sangrava amor e fugia.
Colecionava na carne os gumes dourados que escreviam canções de saudade às lâminas que o corpo consumia.
E entre danças na corda bamba do medo, ela misturava-se na multidão que, quiçá, fugia também. Ao virar das esquinas, por entre os fios de cabelo negro, ela olhava para trás certificando-se de que ele não a seguia.
O que ela não sabia é que ele a perseguia lá dentro, nunca lá fora.

Fernanda Huppert

Mata Atlântica

Postado por Fernanda Huppert 0 Viajaram Aqui
Hoje Dia da Mata Atlântica, dia propício para começar um texto e um Blog.
Fico imaginando aqui, quantas árvores não foram plantadas hoje, quandos hinos verdes não foram cantados e simbolizados por crianças em seus trajes escolares.
Quantas manifestações não foram feitas diante de algum orgão público, federal ou estadual, quantos? quantos? quantos?

Aí me pergunto:Só hoje?O Dia da Mata é todos os dias, a preocupação desta floresta está aí, estampada em anuncios que pessoas passam e mal lêem, gastam-se tantos papéis para isso, e na verdade apenas ¹/³ desta população reage e tenta fazer algo.É gritante ver a necessidade de tanta ajuda e sentir-se impotente.

Mas ainda acredito que este ¹/³ antes que toda esta beleza acabe, se triplique, triplique, assim como os $$$$$$$$$$$$ de nossos políticos e assim consigamos salvar parte de tudo o que nos foi dado de presente!

Fernanda Huppert