Entre Desejos e Fugas

Postado por Fernanda Huppert
Ela sangrava amor. E fugia. E os corpos apagados nos quais ela embatia sem pedir desculpa não reparavam porque o amor não é como o sangue – não mancha a roupa.
Os gritos mudos de socorro não lhe saíam da boca cada vez mais suja de amor.
As pernas não eram mais pernas, eram antes pedaços de dor numa marcha desvairada pelos becos. Os olhos ferozes deixavam de o ser quando os corpos desalinhados os escondiam do mundo. O medo era, nesses dias, a força dos ventos e dos mares que ela traçava nas ruas sem que ninguém os sentisse no rosto. Porque ela sangrava amor e fugia.
Colecionava na carne os gumes dourados que escreviam canções de saudade às lâminas que o corpo consumia.
E entre danças na corda bamba do medo, ela misturava-se na multidão que, quiçá, fugia também. Ao virar das esquinas, por entre os fios de cabelo negro, ela olhava para trás certificando-se de que ele não a seguia.
O que ela não sabia é que ele a perseguia lá dentro, nunca lá fora.

Fernanda Huppert

0 Response to "Entre Desejos e Fugas"