Primeiro Beijo e All Star

Postado por Fernanda Huppert
FêHuppert - Maio/10


Parecia que tudo  havia se reunido num sorriso súbito, um sorriso liberto do coração, preso nos lábios. Sentia-se orgulhosamente mulher, com uma confiança e vaidade desmedidas, como se trouxesse nas roupas femininas toda a vontade colossal de viver. No rosto uma normalidade falsa, nos olhos uma ansiedade única. Sentia-se curiosamente feliz e nenhuma máscara senão a da própria felicidade a poderia esconder. No radio tocavam músicas pouco comuns ao cotidiano, mas gostava de ouvir músicas diferentes do habitual, enquanto fazia do banco do carro a sua sala de espera. E era como se repentinamente não houvesse rádio, mas houvesse orquestras sinistras no coração, onde batidas ansiosas ecoavam pelo miocárdio e se repetiam nos olhos, num brilho incomum.

Sobre os olhos, o lápis preto desenhara um traço de realce, como se não fosse os olhos que quisesse marcar, mas sim a sua presença. Ela vestiu o coração de esperança, como se o castanhos dos olhos estivessem subitamente trancados também no coração. Arrumou o cabelo. Reparou no realce dos olhos e gostou do brilho que refletiam deles, como se subitamente eles fossem pedras preciosas. Ela sentia-se extremamente criança, trancada numa casa de bonecas, onde o mundo da fantasia girava ao redor dos seus cabelos castanhos claros. Sentia uma felicidade infantil. Tinha medo, ansiedade, mas também esperança. Caminhou pelo corredor. Disseram-lhe que estava bonita como nunca. Elogiaram sua roupa. E ela caminhou pelo corredor, com o coração batendo em arritimia, nas músicas descontroladas de um uma ansiedade amorosa que o seu coração despertara contra a sua vontade, mas que sabia que lhe fazia bem. Trazia na expressão facial um olhar triunfante, feliz, Sorriu para si mesma.. Caminhou, sentia o seu rosto quente, como cerejas, deliciosamente maduras. Sentia vergonha, mas também uma auto-estima. E caminhava, com o olhar entre o triunfante e o envergonhado, numa vontade súbita de correr enfrente e a de voltar para trás. Mas não, ela não iria para trás, não o poderia fazer, o coração não permitia-lhe isso nem ela o queria. Ao fundo, a porta. Aguardou que a abrissem..

Olhou para o chão, lá em baixo, nos seus pezinhos 35, os favoritos All Star.
Sentia-se bem para si mesma com eles.
O All Star era o seu sapatinho de cristal como Cinderela moderna.
E ela voltou a sorrir para si mesma.
A porta abriu-se, lá dentro, a sua esperança, a sua ilusão.
E o seu primeiro beijo.
Achava-se Mulher, mais ainda era uma doce e pequena menina, que levaria para a vida toda, o primeiro beijo guardado em seus lábios.

Fernanda Huppert

1 Response to "Primeiro Beijo e All Star"

  1. Kenia Santos Says:

    Todos os primeiros beijos são inesquecíveis, mesmo depois que a gente cresce.

    Lindo texto. =)

    Beijoca! =*